Enquanto, na superfície, as bravatas do presidente da América Mexicana (anteriormente, EUA) indicam suposta retirada de palestinos da Faixa de Gaza (o que se enquadraria como crime de guerra) e intervenção estadunidense para término da guerra na Ucrânia (que o país do leste europeu declinou, porque atrelada à exploração de minério), no contexto da política interna, Trump promove guerras culturais 3.0 ostensivamente, extinguindo com uma canetada programas de inclusão e diversidade em todas os âmbitos do governo federal, cancelando financiamento de importantes projetos sociais, além da perseguição aos imigrantes e deportações em massa.
Enquanto, nas profundezas da versão digital-inteligência-artificial das guerras culturais, a América Mexicana põe a vida de pessoas pretas, indígenas, latinx, dissidentes de gênero, neurodivergentes, PCDs, em risco, o Brasil assiste à estreia do filme O Brutalista, que narra o começo de um arco histórico de longa duração, que desembocará 80 anos depois na eleição do pato Trump para um segundo mandato na Casa Branca. A chegada do protagonista, o arquiteto húngaro fictício László Tóth (Adrien Brody) “à América”, simbolicamente retratada desde um despertar nas profundezas de um navio e ascender até a luz, o convés, de onde acotovelando-se com outros viajantes em farrapos como ele, vislumbra, num ângulo estranho, fragmentada, a miragem de uma Estátua da Liberdade pouquíssimo heroica.
O Brutalista, anti-épico de três horas e meia de duração, dirigido por Brady Corbet (EUA, 1988), é um filme de guerra. A guerra que termina na Europa de onde o protagonista foge, e também a que ele encontra no cotidiano de um imigrante judeu no interior da Pensilvânia.

A arquitetura, metáfora de todos os sentimentos e atitudes dos personagens, evoca o brutalismo, mas fica muito longe da beleza bruta do concreto armado aparente erigido para abrigar escolas, moradia operária ou outras edificações funcionalistas do ponto de vista estético das vanguardas modernistas. Sem meias palavras, a arquitetura retratada no longa é ruim, medonha, desproporcional. Os comentadores que compararam László Tóth a Marcel Breuer apenas demonstram a própria cegueira. Qualquer semelhança começa e termina com a bela cadeira que o arquiteto desenha para a fábrica do primo Attila Molnar (que adotou o sobrenome Miller), pouco depois da chegada à Filadélfia. Esta, sim, inspirada na Cesca Chair (1928), de Breuer, que no filme escancara a diferença de visões do arquiteto húngaro e o primo designer de móveis que cristianizou o próprio nome e cuja esposa é uma republicana xenofóbica.
Antes de ser covardemente dispensado do escritório de Molnar, Tóth conhece, por seu intermédio, membros da família Van Buren, que vão determinar sua vida e carreira. Inicialmente é comissionado para desenhar uma biblioteca moderna na casa do patriarca. Harrison Lee Van Buren (Guy Pearce) descobre que o excêntrico decorador de sua sala de leitura era um arquiteto famoso na Hungria antes da Segunda Guerra, aluno da Bauhaus e autor de destacados edifícios modernistas. O empresário que enriqueceu às custas da guerra decide comissionar o refugiado para a criação de um centro comunitário para a cidade de Doylestown, Pensilvânia, obra que deixará Tóth obcecado.