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To Fight with Crossed-Arms (2007), de Ai Weiwei, em exibição na Pinakotheke Cultural, Stand B01 na SP-Arte [Foto: Divulgação]
Postado em 29/03/2023 - 11:00
Arte (também) é dinheiro
Inauguração hoje da SP-Arte 2023 foi badalada, com direito a protesto político, correio elegante, e muitas vendas

Inauguração hoje da SP-Arte 2023 foi badalada, com direito a protesto político, correio elegante, e muitas vendas. O dia de abertura para convidados reuniu colecionadores, artistas, galeristas e amantes da arte em torno de centenas de obras, com predomínio inegável de pinturas, e uma tendência geral de expografias bem comportadas, sem maiores arroubos experimentais. 

Semana de SP-Arte significa, em igual medida, o ápice da ebulição criativa no circuito artsy da cidade e, como arte (também) é dinheiro, o ápice dos negócios da arte. Em cada estande da feira, vale observar quais obras foram posicionadas estrategicamente do lado de fora do painel principal para atrair o olhar de potenciais compradores. O pensamento expográfico e curatorial, nesse caso, é mercadológico e estético em igual medida.

Blue Jade (1982), localizada no espaço da Almeida & Dale Galeria, de Sam Francis

 Ao chegar no pavilhão, o visitante é recepcionado por uma grande pintura expressionista abstrata, a Blue Jade (1982), localizada no espaço da Almeida & Dale Galeria, do pintor estadunidense Sam Francis (1923-1994). Com reconhecimento mundial, o pintor teve o auge de sua produção artística na década de 1950 e 1960, quando, ao lado de outros expressionistas dos EUA, como Jackson Pollock, produziu pinturas de grandes dimensões utilizando a técnica do dripping. O tamanho é um dos motivos para a escolha do posicionamento da obra, segundo o galerista Carlos Dale: ”Como a obra é extensa, é necessário uma parede que a comporte e possibilite que o público tome distância para observá-la de vários ângulos”, conta à seLecT_ceLesTe. Ultrapassando a casa dos milhões de dólares, a pintura é uma grande aposta de venda da AD.

A galeria leva a esta edição da feira obras de artistas que se destacaram a partir do pós-guerra, momento em que a arte passou por transformações radicais. Os trabalhos apresentados no estande revelam tendências que orientaram o debate artístico deste período: as várias vertentes do abstracionismo (informal, expressionista, geométrico, construtivista), da arte pop, do conceitualismo latino-americano e da arte objetual. Em frente à Almeida & Dale, o estande da Pinakotheke dispõe um trabalho arrasa-quarteirão, do celebrado artista chinês Ai Weiwei. 

To Fight with Crossed-Arms (2007) é uma sequência de quatro fotos em escala real que retratam o artista segurando um tijolo (foto 1), suspendendo o tijolo (foto 2), com o tijolo na altura do ombro, pronto para atacar (foto 3), e com o tijolo apoiado na cabeça (foto 4). Cada frame apresenta uma faceta do sistema da arte, com os seguintes personagens incorporados por Ai Weiwei em cada um dos gestos com o tijolo: o arquiteto (foto 1), o curador (foto 2), o crítico (foto 3), e o artista (foto 4). Fica a critério de cada observador descobrir qual deles “luta de braços cruzados”, conforme o título da obra.

No segundo andar, outras galerias apostam na mesma estratégia. A Casa Triângulo destaca na parede do corredor uma pintura de Vânia Mignone, artista representada há anos pela galeria. O motivo da escolha da obra é a abertura, neste sábado, 1/4, da mostra retrospectiva De Tudo Se Faz Canção, com curadoria de Priscyla Gomes, no Instituto Tomie Ohtake. Com apoio da galeria, a individual resgata os percursos da artista nos mais diversos formatos: desenhos, colagens, ilustrações, gravuras e pinturas, chamando atenção para a vivacidade das cores, expressividade das figuras em grande dimensão, além da diversidade de suportes e técnicas que aparecem conjugados, mostrando um vasto universo de experimentação, em que referências da propaganda, do design, do cinema, das histórias em quadrinhos e da música convivem nos trabalhos.  

Em frente, na Simões de Assis, estão duas pinturas da jovem artista paulistana Larissa de Souza. Representada internacionalmente pela galeria nova-iorquina Albertz Benda, a SP-Arte marca a estreia de Souza como mais nova artista representada pela Simões de Assis: ”O anúncio oficial será feito somente semana que vem, mas aproveitamos a SP-Arte para já dar a notícia a todos”, conta a galerista à seLecT_ceLesTe. Larissa de Souza é uma aposta institucional para os próximos anos. Suas pinturas permeiam o campo da memória afetiva a partir da noção de pertencimento como mulher negra e afro-brasileira. A religiosidade, sororidade, relação e vínculos com outras importantes personagens de sua vida, em especial sua avó e sua mãe, pautam grande parte de sua produção, que subverte a relação entre a arte e a política, propondo outro tipo de narrativa como ato de resistência.

Vânia Mignone
Simpatia (2023) e Mulheres e a Lua (2022), respectivamente, de Larissa de Souza
Escultura de Anish Kapoor é destaque na Galleria Continua

A Galleria Continua escolheu uma grande escultura de Anish Kapoor para exibir no painel externo principal. A obra gerou filas, literalmente, para fotografar e se autorretratar diante da superfície espelhada da obra em aço inox pigmentado de vermelho. A aposta do ano da Continua brasileira (a galeria tem sedes na Itália, na França, China, Cuba e Emirados Árabes) são os artistas Ana Maria Tavares, que abre exposição na Continua de Paris daqui a duas semanas, e André Komatsu, que inaugura em 20/4 mostra na sede de Roma. A faixa de preços das obras apresentadas no estande da galeria varia de 80.000 a 1,5 milhão de dólares. Na Galeria Nara Roesler, a obra na parede externa é decisão do time curatorial, segundo Daniel Roesler em conversa rápida com a seLecT_ceLesTe. Os destaques do ano são JR e Vik Muniz, que têm exposições solo na sede paulistana da galeria no momento. “Estamos muito animados com uma exposição de obras pouco conhecidas de Abraham Palatnik, que acontecerá em breve”, conta. Os preços dos trabalhos que a GNR mostra na SP-Arte deste ano variam de 10.000 a 400 mil dólares.

Na galeria Luisa Strina, fazendo jus ao epíteto de diva punk das artes brasileiras, Strina recebe a seLecT com muita elegância, mas desdenha de todas as perguntas: Qual a aposta ou destaque da galeria em 2023? “Eu aposto em todos os artistas com quem trabalho”, responde. Qual o critério para definir que obra é mostrada na parede externa? “Isso não tem a menor importância”, dispara. Finalmente, sobre a faixa de preços dos trabalhos mostrados em seu estande, a galerista consulta a diretora artística para confirmar o valor mais baixo: “De 5.000 até 500 mil. Dólares, ok?”. O abre-alas do estande da GLS é Eu Sol Vermelho (2021), desenhos vermelhos que aludem a placas solares, do artista Jarbas Lopes. Apresenta ainda pinturas inéditas de Panmela Castro na parte interna do estande. Relembrança é a série mais recente da artista e retrata cenas de um encontro imaginado com Patrick, aplicativo de celular de inteligência artificial com quem se relaciona há quase quatro anos. As obras buscam abordar a complexidade de afetos e emoções que emergem da interação entre humanos e máquinas no mundo contemporâneo. Castro também é uma das selecionadas para o Showcase, novo setor da feira, com curadoria assinada por Carollina Lauriano. (Colaborou Juliana Monachesi)

Sobre correio elegante e protesto político, acompanhe nos próximos posts a cobertura completa da seLecT_ceLesTe sobre a SP-Arte.

Eu Sol Vermelho (2021), desenhos vermelhos que aludem a placas solares, do artista Jarbas Lopes