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Obra de Carolina Caliento, exposta no Arte Atual Festival, Instituto Tomie Ohtake
Postado em 31/05/2018 - 1:09
Caderno de notas: Carolina Caliento
Artista paulistana tem a cidade como matéria prima
Theo Monteiro

O ponto de partida de Carolina Caliento foi a pintura. Pintura com profundo interesse em representações do meio impresso: cenas extraídas de jornais e tendo como “pano de fundo” a paisagem urbana. Como desdobramento desta etapa, em Refugos, Caliento deixa a pintura para trabalhar exclusivamente com a fotomontagem. A paisagem urbana agora é o sujeito por excelência: através de recortes de jornal em preto e branco, a artista cria um cenário instável, apocalíptico, opressivo, onde blocos de edifícios se amontoam ao lado de túneis, viadutos e vigas de concreto, acompanhados, ainda, de cenas de acidentes de trânsito e alagamentos. A presença da água é uma constante nessas fotomontagens.

Na série de monotipias, por outro lado, some o caráter caótico e o elemento humano ganha força. As personagens criadas pela artista têm suas individualidades pouco acentuadas: são aparentemente trabalhadores ou pessoas muito humildes carregando objetos pesados ou grandes o bastante para demandar esforço. Curioso notar que estes itens são, em sua maioria, básicos de sobrevivência: colchões, sacas, botijões de gás, cadeiras, lenhas. Se não indispensáveis por sua utilidade no ambiente doméstico, o são para o trabalho. São materiais que escravizam aqueles que os carregam, condenando essa anônima humanidade a um universo obscuro.

Qual a sua formação, e por onde o seu trabalho tem se direcionado?

Sou formada em artes plásticas e tenho um mestrado em artes visuais. Meu trabalho trata da cidade. Eu parto de uma ampla investigação de imagens, que serve como matéria prima: são fotografias tiradas por mim, imagens impressas nos jornais e retiradas da internet. Depois, eu recorto pedaços e remonto fragmentos dessas imagens por meio da colagem/ montagem, para assim, articular um novo discurso urbano.

Ultimamente tenho experimentado outras técnicas, como monotipias e desenhos, para trabalhar os fragmentos resultantes deste processo. Em alguns casos, estes fragmentos continuam a ser reorganizados com outros, em outros casos eles são justapostos. De todo modo, os dois modos que venho experimentando para repensar o trabalho parte de uma lógica da montagem.

Como se deu a proposta para o Festival Arte Atual? Conte um pouco do processo de elaboração e montagem.

Eu apresento dois trabalhos na exposição. Um são algumas das fotomontagens da série Refugos. Este trabalho foi desenvolvido durante minha pesquisa de mestrado e, portanto, o modo como ele seria instalado, qual o parafuso que iríamos utilizar, qual a distância entre obras… tudo isso, de certo modo, já havia sido pensado antes, quando eu apresentei ele para a defesa de minha dissertação, então a montagem foi bem simples.

O segundo trabalho, a série de monotipias Carregadores, é um trabalho bem recente. Penso que a sua montagem e organização teve um caráter mais experimental. Nesse sentido, poder montá-lo e encarar a sua exposição como uma etapa processual, como um modo de repensar o trabalho, é muito proveitoso.

Pensando no tema da exposição, nas noções de absurdo, acúmulo e serialidade, como você vê essa discussão refletida no seu trabalho?

Eu acho que essas noções estão presentes na cidade e na vida da cidade – na experiência de transitar pelas ruas e observar todas as contradições, de ler o jornal com todas as narrativas que colocam a cidade à beira de um colapso. Portanto eu acho que de certo modo, eu tenho que pensar nelas ao pensar sobre a cidade, para engendrar o meu trabalho.