O silêncio da galeria foi atravessado por uma única voz, que, na língua Yanomami, entoou um tributo à arte como instrumento de luta e uma emocionante reverência a Claudia Andujar. “Minha fala é a arma do povo originário”, afirmou Davi Kopenawa, durante seu discurso na cerimônia de abertura da nova exposição do pavilhão da artista no Inhotim, no último sábado, 26/4. O espaço foi rebatizado com o título da mostra: Maxita Yano, ou casa de terra.
Pela primeira vez desde sua inauguração há dez anos, a galeria recebe uma nova configuração, incorporando 90 obras fotográficas e audiovisuais de 22 artistas indígenas da América do Sul. O diálogo busca complexificar e expandir a obra de Andujar, propondo uma leitura ao lado de artistas contemporâneos, como explica a curadora Beatriz Lemos durante visita à exposição. Sobretudo, destacam-se a autorrepresentação e o protagonismo artístico indígena.

Grande parte da expografia da galeria manteve a montagem original de 2015, com pequenas intervenções para incluir as novas obras em comodato – acervo sob os cuidados da instituição, durante a exposição de longa duração –, entre elas cinco comissionamentos. Das 205 fotografias de Andujar expostas (recorte das mais de 100 obras da coleção do Inhotim), cerca de 30 imagens nunca haviam sido exibidas no pavilhão. Para demarcar os espaços destinados aos artistas convidados, a mostra desenha molduras cinza nas paredes que os acolhem nos núcleos temáticos – sem divisão cronológica ou títulos –, formando uma narrativa fluida.
Ao lado de Beatriz Lemos, a equipe curatorial – formada por Marilia Loureiro e Varusa – destacou os eixos do projeto: além da reformulação da exposição, há o desenvolvimento de um ciclo de programação pública, voltado a ativar espaços externos da galeria com shows, performances e conversas. Renata Tupinambá também esteve à frente da reestruturação feita a partir de um diálogo com povos indígenas do território de Brumadinho, que determina o conteúdo da programação ao longo do ano e cria uma peça de “imagens sonoras” – guia disponibilizado aos visitantes com uma coletânea de narrativas e sonoridades não visíveis no território de fronteira entre o parque e a mata.
“A luminescência feita com os grafismos representa a manifestação dos espíritos ancestrais”, aponta Desana à celeste. O uso da luz ressoa de forma muito particular quando vista ao lado de Andujar, como em Sem título (1974), da série Casa, que ressalta a entrada de luz em uma estrutura comunal Yanomami.

ENCONTRO INTERGERACIONAL
Ao longo do extenso pavilhão, o encontro entre gerações é celebrado em diversos momentos. Híbrida (2025), curta-metragem de Graciela Guarani, Alexandre Pankararu e Tiniá Pankararu-Guarani, aborda a juventude indígena distanciada de um propósito comunitário em um cenário distópico. Tiniá é a filha do casal e protagonista do filme, simbolizando o encontro entre as culturas Pankararu, de Pernambuco, e Guarani Kaiowá, no Mato Grosso do Sul. A produção é idealizada, dirigida e protagonizada em família, e viaja por diferentes temporalidades para afirmar a importância da luta indígena para as novas gerações. Alexandre Pankararu conta à celeste sobre a importância deste movimento de resgate das conquistas e desafios da autonomia dos povos. “A gente tá percebendo que estamos num mundo de quatro linhas, como o mundo ocidental. Mas o nosso mundo e o nosso tempo de ser é circular […] Meus filhos não acompanharam as gerações que deram sua vida pelo território e pela nossa cultura. Então há uma preocupação de usar essa linguagem (das redes sociais) e aplicar a temática do futurismo para chamar a atenção dos jovens também”, afirma.
O público ainda poderá conferir na mostra de longa duração os trabalhos dos artistas convidados Edgar Kanaykõ Xakriabá, Tayná Uráz e Denilson Baniwa, além dos nomes internacionais Elvira Espejo Ayca, Julieth Morales, Olinda Silvano, David Díaz González e Lanto’oy’ Unruh.
SERVIÇO
Galeria Claudia Andujar | Maxita Yano
Instituto Inhotim
Em exibição por tempo indeterminado
Beatriz Ferro viajou para Brumadinho para a abertura da Galeria Claudia Andujar | Maxita Yano a convite do Inhotim