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Tambobass, de Vivian Caccuri (Foto: Ilana Bar/ Estúdio Garagem/ Fundação Bienal de São Paulo)
Postado em 21/10/2016 - 6:07
No meio do jardim, uma vela
Vivian Caccuri e Bené Fonteles criam altares e propõem rituais para a celebração de encontro com outras formas de conhecimento
Paula Alzugaray e Márion Strecker

Se o radar da curadoria da 32ª Bienal de São Paulo Incerteza Viva está orientado no sentido de interrogar territórios conhecidos e captar outros sistemas de conhecimento, abrindo-se para códigos simbólicos de naturezas diversas, encontramos no Pavilhão dois casos exemplares de trabalhos que penetram na esfera ritualística da convivência humana.

TabomBass (2016), de Vivian Caccuri, é um sistema de som feito com alto-falantes empilhados, como ocorre nas festas de rua. Diante deles, três velas acesas reagem ao ar deslocado pelo ritmo de sons graves. “Esse aqui é um altar que eu construí para o grave dos ritmos do Atlântico. É um altar que na verdade é um sound system, feito com subwoofers, as caixas que reproduzem as frequências graves da música. Então, quando você está aqui, sente um som muito pulsante, um som que ressoa dentro de você”, diz Caccuri à seLecT.

A instalação sonora é uma celebração do encontro entre a música brasileira e a música de Gana, para onde a artista realizou viagem de pesquisa. Assinada com outros dez produtores musicais da cidade de Acra, capital de Gana (Keyzuz, Yaw P, Wanlov, Steloo, Panji Anoff, Mutombo da Poet, Ghalileo, Sankofa, Mensahighlife), o TabomBass toca uma vez por hora no Pavilhão da Bienal, fazendo o edifício vibrar com as linhas de baixo de músicas desses artistas ganenses. As velas celebram a viagem permanente que a música da África-Oeste faz cortando o Atlântico e chegando às Américas. “Dei o nome de TabomBass porque ‘Tabom’ é um povo que foi para Gana no começo do século 19. Eram ex-escravos brasileiros que foram exilados e mandados ‘de volta’ para a África. E lá, em Gana, eles ficaram. Então eu considero que isso já é um caminho que estava aberto entre Brasil e Gana e esta obra é para criar um neocaminho e um diálogo entre esses dois países nesse eixo do Sul que pouco acontece.”

O trabalho do artista paraense Bené Fonteles chama-se Ágora: OcaTaperaTerreiro (2016). Ele define essa obra-instalação-lugar como um fórum para se fazer um exercício de antropofagia. A oca, ela mesma ancestral, arquitetonicamente, “come o modernismo” da arquitetura de Oscar Niemeyer. As colunas do Pavilhão da Bienal foram pintadas pelo líder indígena brasileiro Ailton Krenak. Em parceria com Krenak, Bené elaborou também um programa de encontros intitulado Conversas para Adiar o Fim do Mundo. Convidou artistas e artivistas como os músicos Egberto Gismonti, Chico César,  Marlui Miranda e Tetê Espíndola, os artistas Ernesto Neto e Claudia Andujar, e o xamã Davi Yanomami. O calendário de encontros e vivências se estenderá até dezembro. O objetivo é “celebrar e ajudar a curar a alma da nação brasileira, que está muito dolorida com tudo que está acontecendo”, diz Bené, que vive em Brasília.

Tambobass, de Vivian Caccuri (Foto: Ilana Bar/ Estúdio Garagem/ Fundação Bienal de São Paulo)
Tambobass, de Vivian Caccuri (Foto: Ilana Bar/ Estúdio Garagem/ Fundação Bienal de São Paulo)