É alentador constatar que o país esteja na contramão da tendência xenofóbica mundial. Uma pesquisa divulgada esta semana pelo Instituto Superior de Economia e Gestão, da Fundação Francisco Manuel dos Santos, coloca a ênfase na necessidade de Portugal ser aberto à imigração e controlar a emigração. O estudo aponta que, se Portugal fechasse já as portas à imigração, se contasse apenas com as suas taxas de fecundidade e de mortalidade, encolheria. Passaria dos atuais 10,4 milhões para 7,8 milhões de habitantes, até 2060. Com isso, teria “menos relevância à escala internacional e menos peso em arenas como a União Europeia”. A recomendação é de que o país deve explorar várias “vias de entrada” para estudantes e profissionais estrangeiros.
As conexões entre Portugal e a comunidade internacional vem sendo incrementadas por instituições como o Museu de Arte, Arquitetura e Tecnologia (MAAT), da Fundação EDP. Como principal patrocinador da ARCOlisboa, a EDP alinhou a programação de sua principal plataforma cultural ao evento internacional. Um dia antes da abertura da feira, inaugurou três exposições no campus da Fundação: um site-specific do cubano Carlos Garaicoa no salão oval do MAAT; e instalações dos portugueses João Onofre e Ana Pérez-Quiroga em galerias do edifício da antiga Central Tejo.
O campus da Fundação EDP divide-se em dois edifícios e um jardim, projetado pelo arquiteto libanês Vladimir Djurovic, ainda em construção. A Central Tejo, autêntica “fábrica de eletricidade”, foi construída em 1908, para fornecer a rede elétrica da cidade de Lisboa, e funciona como Museu da Eletricidade desde 2006. Com a inauguração do MAAT, no ano passado, incorporou a cultura contemporânea ao seu programa.
O prédio do MAAT, projeto do escritório AL_A, tem a transparência e a luz como palavras-chaves. Sua fachada se coloca como um refletor que interage com a luz do rio Tejo. A posição dos mosaicos é calculada de modo a criar efeitos luminosos diversos, em relação com períodos do dia e do ano. O fascinante é que, com toda sua tecnologia de ponta, há neste edifício uma clara simbiose não só com a natureza, mas também com a história da matéria portuguesa por excelência, o azulejo. Com isto, não é exagero afirmar que o complexo museológico é o coração da revitalização cultural, paisagística e urbanística de Lisboa.
O projeto curatorial da instituição é do arquiteto e crítico Pedro Gadanho, “resgatado” da curadoria do Departamento de Arquitetura e Design do MoMA-NY para assumir o cargo. “Portugal teve sempre a tradição do acolhimento”, diz Gadanho à seLecT. “Durante a Segunda Guerra, foi lugar de refúgio e plataforma de passagem de Europeus para o Brasil e os EUA”.
Finalizada a ARCOlisboa, o MAAT sedia esta semana o evento Post-Internet Cities, conferência internacional dedicada a promover reflexão crítica sobre como as tecnologias digitais afeitam a vida nas cidades. Participam do projeto profissionais de todo o mundo, inclusive a artista Giselle Beiguelman, professora da FAU-USP e conselheira editorial de seLecT. Beiguelman realiza, na terça-feira (23/5), a conferência “Arte, Espaço Público e Territórios Informacionais”.
Passado e futuro
Ao voltar-se para o patrimônio cultural e o futuro da cidade, o museu à beira do Tejo alinha-se ao partido curatorial do evento “Passado-Presente: Lisboa Capital Ibero-americana de Cultura”, que ao longo de todo o ano de 2017 situa em 72 instituições lisboetas um programa de exposições e conferências para pensar as relações entre Portugal, Espanha e os países latino-americanos.
“Não faz parte deste programa a promoção de uma qualquer identidade ibero-americana. Primeiro, porque ela não existe, nem tão pouco tem uma gênese natural e, segundo, porque não existe nenhum comércio dos aspectos simbólicos que a mesma poderia suscitar”, explica o coordenador-geral António Pinto Ribeiro. “Bem longe estamos das exposições internacionais, surgidas no século 19, que tinham este comércio como objetivo prioritário. Contudo, a diversidade deste espaço geográfico e deste mosaico de identidades imaginárias é uma aventura do conhecimento para os nossos dias”.
Ao se colocar como centro deste espaço geográfico diverso, Lisboa promove discussões dentro de quatro linhas curatoriais: a questão indígena, a questão afro-descendente, as migrações e a cultura contemporânea. Dentro deste espectro, a brasileira Paloma Bosquê realiza no Pavilhão Branco a sua primeira exposição individual institucional. Em um conjunto de 21 trabalhos escultóricos, a artista interage com a luminosidade do interior e exterior da galeria de arte contemporânea, que habita os fundos do jardim de um palácio.