É como se cada artista inventasse um idioma próprio, com o qual irá se posicionar no mundo e, para que seja possível discernir a mensagem que se agita emaranhada nessa linguagem, fosse preciso escutar. Por um tempo. Esse pensamento que me assola diante de Domingo, instalação de Leandro Muniz na Casa de Cultura do Parque, está de certa forma plasmado nas primeiras linhas do texto que Tarcísio de Almeida escreveu para a exposição, mas que só li dias depois de ter anotado no meu caderno de notas: “É como se cada artista tivesse um idioma…”
Permaneço um tempo debaixo do sol forte, entre as sombras dos tecidos que ventam pendurados em linhas cruzadas. Noto o comportamento imprevisível dessa obra instalada ao ar livre, que resiste a se deixar fotografar ou capturar pela atenção compenetrada. Na conversa com o artista, ele fala sobre “uma sensação de domingo”. Sobre aquela expectativa de
colocar ordem na casa e na vida, concentrada em um ínfimo fragmento semanal de tempo, um domingo. Mas a vontade de organização escapa no movimento das roupas no varal.
Em pinturinhas que se distribuem de forma desorganizada nas superfícies dos lençóis – repetindo seu formato retangular e criando, com isso, uma sensação de encaixe instável –, é possível de pronto discernir fragmentos de “idiomas” de outros artistas: uma cachoeira enquadrada, um sol no canto do quadro, um tabuleiro que pode ser de xadrez, cortinas em uma janela.
Reminiscências da história da arte? Dados de memória tanto da arte quanto do cotidiano, diz o artista. Uma condição dúbia, potencializada pelo fato de Domingo ser uma instalação de arte em um espaço físico que há pouco tempo foi uma casa de morar.
O projeto de Muniz para a Casa completa-se com Azulejo, Tapetinho nº 6 e camiseta da série Casca, instalados num espaço de passagem, na área interna. Relacionar-se direta e frontalmente com o lugar que ocupa é uma prioridade para o artista. Ele enfrenta com rigor a parede de 2,80 x 10,20 metros, atravessando com pinceladas finas de tinta acrílica as oscilações do reboco e deixando transparecer, na irregularidade das linhas dos azulejos desenhados, a pulsação do próprio corpo. Então, fala sobre a leitura de um texto sobre a resistência do objeto que se impõe sobre o intuito.
Nessa manhã de meio de semana, no pico do aperto da agenda de uma quarta-feira, nos perdemos entre grids de estampas e nos equilibramos sobre linhas de textos citados. Mas, diante da pintura Tapetinho nº 6, que interpreta a vida prosaica dos paninhos colocados sobre os pisos dos banheiros, compreendo finalmente que o assunto aqui não é pintura, é vibracional: estamos falando do vigor da luz exterior, das bordas desfiadas, de como a cor escapa ao quadrado e vibra no espaço das planilhas que não se fecham e que ventam. É domingo.
SERVIÇO
Domingo – Leandro Muniz
Encerrada
Casa de Cultura do Parque
Av. Fonseca Rodrigues, 1.300
https://ccparque.com/