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A atriz Ligia Cortez em cena como Ellida Wangel no espetáculo, que extrai apuro visual do jogo de luz e contraluz e do minimalismo (Foto: Luciano Romano)
Postado em 17/06/2013 - 10:56
Pintura viva
Elenco de A Dama do Mar, em cartaz no Sesc Pinheiros até 7 de julho, traz atores como Bete Coelho e Luiz Damasceno em adaptação do texto de Ibsen por Susan Sontag
Luciana Pareja Norbiato

Pintura também pode ser vista no teatro. A prova está no espetáculo A Dama do Mar, em cartaz até 7 de julho, em que o encenador norte-americano Robert Wilson cria no palco do Sesc Pinheiros quadros vivos usando pinceladas de luz.

Para ampliar o significado da história de uma mulher dividida entre a permanência na vida familiar e a busca pela liberdade em um mundo sexista, Wilson cria um visual meticuloso recortado em luz e contraluz, que reconstroem a cada instante o cenário de poucos elementos.

As cores, quase todas primárias e neutras, surgem vivas na brancura dos rostos, no céu azul do fundo, em unhas e nas bocas vermelhas e negras, resultando num expressionismo minimalista que não soa contraditório.

Assim como os pintores, Wilson começa o trabalho pelo fundo – no caso, o cenário, que ele considera a arquitetura entre o que vê e o que ouve. Contra o pano de cena iluminado os atores imprimem seu gestual preciso, por vezes meras silhuetas. A repetição de frases e de movimentos maquinais pontuados por efeitos sonoros, marca registrada das encenações de Bob Wilson, se assemelha à sobreposição de camadas de tinta, que dão densidade à composição.

Ao apagar os traços realistas e exagerar aqueles que pretende criticar, o encenador evidencia a hipocrisia de normas e de convenções sociais, como no resultado caricato do processo obsoleto de colorização manual de fotografias.

A ficha técnica reúne o melhor de cada área. O diretor, também cenógrafo e criador da ideia de luz da peça, é um dos pais do teatro experimental no século 20. O elenco traz Bete Coelho e Luiz Damasceno, entre outros, além de Ondina Clais Castilho, egressa do grupo de Antunes Filho, que se alterna com Ligia Cortez nos papéis da protagonista Elida Wangel e de Bolette Wangel. Clean, o figurino é de Giorgio Armani.

Baseada em original escrito em 1888 pelo norueguês Henrik Ibsen, a adaptação foi feita pela pensadora norteamericana Susan Sontag em 1998. Com isso, garante-se a atualidade do tema da opressão masculina sobre as mulheres, cujos contornos sofreram grandes mudanças no hiato temporal de mais de cem anos entre as duas versões.

Com tantos elementos a favor, a segunda vez que o norte-americano dirige um elenco brasileiro (a primeira foi em 1974, com a ópera A Vida e a Época de Josef Stálin) não deixa a desejar tanto como experiência estética quanto no seu tema ainda relevante. Evita inclusive cair na armadilha de se perder em seu apuro imagético, que a todo instante presta contas ao que se quer expressar ideologicamente. Deleite para os olhos, reflexão para a mente.

Teatro Paulo Autran – Sesc Pinheiros (Rua Paes Leme, 195, tel. 3095-9400)
700 lugares
Sexta, 21h; sábado, 20h; domingo, 18h
Ingressos R$ 10 a R$ 40 (inteira)
Até 7 de julho