25 de março de 2021. Estamos confinados no momento mais duro da pandemia da Covid-19, encurralados pelo desrespeito que o governo federal dedica aos brasileiros, chorando nossos mais de 300 mil mortos. No espaço, a sonda da NASA expediciona a atmosfera e a superfície de Marte, em busca de vestígios de vida. A humanidade viaja 470 milhões de quilômetros para encontrar vida enquanto, no Brasil, o Coronavírus mata uma pessoa a cada minuto.
Fevereiro e março de 2013. No contexto da crise social e política mundial, o ciclo de revoltas que ocupara as praças do mundo árabe e acampara em Wall Street estava chegando ao Brasil. A seLecT #10 elege como tema os Paraísos. Utopias, deslocamentos e viagens dão o tom dessa edição. A editora-chefe Giselle Beiguelman e o diretor de arte Ricardo van Steen decretam que Marte é a utopia que nos resta e se reúnem em um projeto de ocupação do planeta vermelho, convidando o artista José Resende, os arquitetos Greg Bousquet e Vinícius Andrade e o designer Gerson de Oliveira para desenharem planos de habitação do planeta.

É no mínimo estranho falar de paraíso, quando estamos no inferno. Mas a edição foi produzida na época em que Marina Abramovic viajava o Alto Paraíso do Brasil central, filmando o documentário Espaço Além: Marina Abramovic e o Brasil. Em entrevista dada a Paula Alzugaray por Skype (então, o único app de conversas), a artista fala de arte, espiritualidade e de sua passagem por Abadiânia, onde foi assistente de João de Deus em cirurgias. Sete anos depois, o líder espiritual foi denunciado por uma cadeia de crimes sexuais macabros, se revelando um monstro. “Tenho uma má notícia para você: não há paraísos”, avisou Abramovic em 2013.
Utopia também é questão em texto do artista cubano Ernesto Oroza, que analisa como Miami e Havana são cidades projetadas com base em um certo ideal de progresso. O paradigma utópico no qual foram fundadas, no entanto, caminha em direções opostas, sendo uma marcada pelo consumo, a outra pela carência.
Colaboram com a edição a crítica Daniela Labra, que lança outra discussão sobre arquitetura e urbanismo, abordando Instant City, um paraíso efêmero, uma cidade de plástico inflável, concebida em 1971, em Ibiza; e a jornalista Maria Clara Vergueiro, em reportagem de comportamento, investigando os sentidos de paraíso para personalidades como o estilista Dudu Bertholini e o crítico literário Antonio Candido.
O Mundo Codificado da edição ataca de paraísos artificiais e destila uma coleção de tranquilizantes, estimulantes, sedativos e alucinógenos. Em sua estreia, a coluna Fogo Cruzado (hoje realizada online no canal da seLecT no YouTube) lança a pergunta: Pra que serve o curador? Tadeu Chiarelli, Lisette Lagnado e Xiclet, entre outros, respondem.
Sempre tensionando fronteiras, seLecT aborda o surfe como experiência estética. Comparando imagens em que a natureza aparece agigantada em relação à fragilidade humana, o crítico Guy Amado conecta o esporte à ideia do sublime no romantismo alemão.
Revelando-se, desde então, uma plataforma de projetos comissionados e site specifics, a seLecT #10 recebeu série inédita do artista Caio Reisewitz, com trabalhos desenvolvidos especialmente para a revista, realizada sobre bairros da periferia paulistana com nomes idílicos, mas com condições precárias de moradia e infraestrutura urbana, como Cantinho do Céu e Jardim Shangrila.