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Postado em 24/04/2013 - 1:35
Uma história que não anda em linha reta
Fernanda Lopes

Em exposição no Rio de Janeiro, Laércio Redondo revela interrogações que incorporam a dimensão coletiva da memória

Laercio

Legenda: Instalação sem título (2013), de Laércio Redondo, composta de 77 bancos, com paisagem de Debret impressa em silk-screen, esconde biblioteca de 77 livros sobre o Rio. (Foto: Paula Alzugaray)

Ao entrar na Casa França-Brasil, o salão central de 200 metros quadrados parece vazio. A construção, de 4 metros de altura e 12 de largura, feita com pequenas ripas de madeira, parece invisível, levando o olhar direto para o fundo do salão. Lá, um pequeno espelho convexo aponta para a entrada da sala e, sob um diferente ponto de vista, conseguimos ler a palavra “Revolver” que as ripas da estrutura de madeira escrevem no espaço. E nos vemos através do reflexo, dentro da obra. Completam a instalação Ponto Cego (2013) alto-falantes nas laterais da sala, através dos quais se ouve um texto escrito pelo próprio artista. “A memória sempre nos acompanha, nos persegue e teima em escorrer feito camadas de tinta pelas paredes”, diz.

A obra é parte da exposição Contos sem Rei, que, com curadoria de Frederico Coelho, reafirma a importância da memória para a obra de Laércio Redondo, que vive e trabalha entre Estocolmo, na Suécia, e o Rio de Janeiro desde 2001. Se há pouco mais de dez anos, em seus primeiros trabalhos e exposições, o artista paranaense demonstrava interesse pelas construções e apagamentos de uma memória pessoal, hoje suas investigações e interrogações parecem incorporar a dimensão coletiva da memória. Especificamente em Contos sem Rei, as obras parecem se interessar pelo processo de construção de uma identidade nacional e pela ligação entre história e arquitetura da cidade. Personagens que povoam o mito da identidade nacional também estão presentes na exposição. Em uma das salas laterais, Redondo apropriou-se de imagens do livro Viagem Pitoresca e Histórica ao Brasil, do artista Jean-Baptiste Debret (1768-1848), para construir três outros trabalhos interligados – todos inéditos. Em um deles, paisagens de um dos mais importantes membros da Missão Artística Francesa de 1816 foram gravadas no assento de bancos, que, juntos, formam um grande plano horizontal onde as paisagens podem ser vistas. Na parte de baixo de cada um dos 77 bancos está um livro indicado por convidados de diferentes áreas.

Redondo disponibiliza para o público uma biblioteca com referências multidisciplinares para a construção da história do Rio de Janeiro. Na outra sala, na instalação Carmen Miranda – Uma Ópera da Imagem (2010), as chamativas bijuterias, flores, frutas, plumas e balangandãs que dançavam seguindo o ritmo da Pequena Notável agora parecem flutuar em delicados móbiles que ocupam toda a sala. Laércio Redondo parece nos lembrar que todos somos partes da história. Todos – o público, a cidade, os personagens históricos, o artista e a história – feitos de partes.

Contos sem Rei
Até 5 de maio
Casa França-Brasil
Rua Visconde de Itaboraí, 78, Centro, Rio de Janeiro

*Fernanda Lopes é editora do site Artinfo Brasil. Ganhadora da Bolsa de Estímulo à Produção Crítica (MinC/Funarte) em 2012, foi curadora da sala sobre o grupo Rex na 29.a Bienal de São Paulo.

*Publicado originalmente na edição impressa #11