Depois da polêmica que envolveu a performance La Bête, o artista Wagner Schwartz chegou a dizer que, apesar dos convites para realizar a ação novamente, as ameaças que recebeu durante o ano de 2017 o impediam de repeti-la no Brasil.
Concebida em 2005, a performance foi apresentada cerca de dez vezes até chegar, 12 anos depois, no 35º Panorama de Arte Brasileira, no Museu de Arte Moderna de São Paulo. Um breve registro da apresentação, no entanto, que mostrava uma criança tocando o tornozelo de Schwartz – enquanto o artista estava deitado e nu – foi veiculado na internet e deflagrou uma onda de agressões e protestos.
Ainda que a sala onde ocorreu a ação estivesse sinalizada, com a informação de que a obra apresentava nudez artística, e a criança estivesse acompanhada da mãe, Schwartz precisou prestar depoimento na 4ª Delegacia da Polícia de Repressão à Pedofilia. O Ministério Público de São Paulo chegou a abrir um inquérito para apurar as denúncias em decorrência da apresentação, mas o caso acabou arquivado após a conclusão de que a La Bête não apresentava qualquer ato que pudesse se aproximar à pornografia infantil.
Na obra, inspirada na série Bichos, de Lygia Clark, não havia qualquer conotação sexual. O artista, deitado diante dos espectadores, convidava o público a manipular seu corpo, como se suas articulações funcionassem do mesmo modo que as dobradiças das peças de metal criadas por Clark na década de 1960. A ideia de La Bête, que em francês pode significar bicho ou inseto, surgiu após a visita de Schwartz a uma exposição na qual um dos Bichos de Clark estava exposto dentro de uma caixa de vidro. A opção curatorial, que impedia a manipulação da obra, contrariava a proposta da artista, que pensou os Bichos também como um convite à participação do público, que poderia moldar as peças em múltiplas configurações.
“Talvez as pessoas que tenham escolhido expor a obra dentro de uma estrutura de vidro estivessem com medo do que acontecesse com ela o mesmo que aconteceu comigo. Medo de que, se o Bicho saísse de dentro do suporte, ele fosse violentado, quebrado, distorcido”, analisa Schwartz.
Após a apresentação no Museu de Arte Moderna, momento em que viu o esfacelamento de sua performance, é possível dizer que o destino do artista se mesclou ao da obra que lhe serviu como inspiração, já que Schwartz necessitou de um período de reclusão para entender a onda de violência que precisou enfrentar.
Quase três anos depois, o artista retorna com sua La Bête pela primeira vez ao Brasil, realizando duas apresentações na Oficina Cultural Oswald de Andrade – antes disso, a performance havia sido realizada apenas na França. Para ele, o momento político atual pede que a ação aconteça e, diante de uma série de enfrentamentos à repressão e à censura no ambiente cultural, Schwartz também afirma se sentir menos sozinho e desamparado.
“É um momento de reconexão com o território brasileiro e de reconquistar essa performance tanto esteticamente quanto politicamente”, diz o artista, que prefere agora não criar expectativas.
Serviço
La Bête
Performance de Wagner Schwartz
10/3, 19h e 21h, Oficina Cultural Oswald de Andrade, Rua Três Rios, 363 | oficinasculturais.org.br