Tatiana Blass usa taxidermia como metáfora do fim da representação.
Na escultura Embora (acima), de Tatiana Blass, cão de parafina derrete com calor de refletores
Nina Gazire
Taxidermia em grego significa dar forma à pele. É a arte de reconstruir um ser morto para exibição ou estudo, e principalmente, uma ferramenta de conservação de uma aparência expirada pela morte. É uma paralisia do que antes foi o invólucro de um ser, permitindo a falsa sensação de que é possível a contenção do que antes foi o corpo vivo. Se taxidermia é a arte de dar forma a algo que expirou, há algo de taxidérmico no entendimento de que algumas produções artísticas, como por exemplo, os retratos, paisagens, naturezas mortas e esculturas tentam representar um momento ou um ser.
A artista Tatiana Blass questiona essa lógica em suas catorze obras expostas no espaço da Caixa Cultural Brasília. Com curadoria do crítico de arte José Augusto Ribeiro, a exposição faz um balanço dos últimos cinco anos da produção da artista, que freqüentemente recorre ao recurso da taxidermia em instalações e esculturas. A mostra também apresenta obras inéditas em vídeo com o objetivo de oferecer uma visada abrangente da trajetória da artista, inclusive os próximos passos da produção. Mas a taxidermia de Blass não é uma taxidermia literal, apesar de suas obras mais conhecidas, Aquele que contava as horas e Cerco fazerem o uso de animais embalsamados.
Exemplo da taxidermia metafórica de Blass é a instalação Embora, feita a partir do molde e de um contramolde de um cachorro inseridos em uma parede. Um cão parece fugir do invólucro que é o seu próprio corpo, feito de latão. Mas escapar é uma missão impossível, o correto aqui seria evanescer. Escapar significaria continuidade, permanência em outro lugar. O cão é feito de parafina e derrete com o calor incidente dos refletores, desaparece. A obra é uma referência ao processo de criação artístico da realização da escultura em metal, onde a forma final só é conseguida após sucessivos erros e infinitos moldes de parafina que não aparecem como parte da obra acabada.
A artista realiza uma reflexão com muita poesia ao ironizar a noção da arte como uma esfera autônoma. Como se a arte fosse produto que existe por si só e independe do público quando acabada. Para Tatiana Blass o que vale não é o troféu de caça, cabeça de uma presa embalsamada como as obras estáticas de um museu ou galeria. E essa é a revelação anti-taxidérmica da produção de Tatiana Blass presente não só em Embora, mas em outros trabalhos dessa exposição
Tatiana Blass
Caixa Cultura l Brasília
Quadra 4 – Lote 3/4
Edifício Anexo da Matriz
4º andar Brasília – DF
21 de junho a 31 de julho