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Rio Bruno (2018), de Alexandre Copês
Postado em 31/05/2018 - 12:53
Caderno de notas: Alexandre Copês
Artista gaúcho fala do processo de elaboração e montagem da instalação Rio Bruto, no Arte Atual Festival
Carolina de Angelis

O que pode definir um desenho? Em Rito bruto há um acúmulo de ideias e discussões que trazem à tona o próprio processo do artista e sua lida com o desenho, como amostra das diferentes formas que essa linguagem pode assumir. O limite entre desenho e pintura aparece embaçado – os materiais para realização de cada uma dessas técnicas se misturam. O giz pastel oleoso, por exemplo, empresta as cores e a fluidez da pintura e veste uma roupa de ilustração. O desenho também se torna convite, estimulando o público a ser cúmplice em uma cadeia de pensamentos por meio de palavras propostas pelo artista. Aqui, a própria palavra torna-se imagem, não apenas por seu conteúdo e significado, mas por seus traços, suas formas, e o desenho ganha caráter narrativo: resume as histórias e/ou conexões de quem se propõe a conversar utilizando os termos dados pelo artista. Esse conjunto de desenhos consegue falar de tempo na urgência e na rapidez empregada em sua fatura, em contraste com a suspensão temporal que ela inspira. E, enfim, relaciona-se com a noção de bruto quando resgata o grafismo como ação primitiva de olhar para o mundo e comunicar-se por meio de imagens, figuras e formas.

Qual a sua formação, e por onde o seu trabalho tem se direcionado?

Sou graduado em artes visuais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) onde entre os anos de 2009 e 2013 desenvolvi parte de minha pesquisa no grupo de desenho Atelier D43, fundado por mim e alguns colegas. Naquela ocasião, propúnhamos discutir as possibilidades de interconexão das práticas gráficas com outras mídias. Diante disso, meu trabalho mantém-se atento acerca dos distintos processos que, ainda guiados pelo desenho, por meio de sua feitura e de seu pensamento, orientam minha investigação entorno desta linguagem e me aproximam de demais processos visuais que também refletem em meu trabalho. O plano do íntimo e do subjetivo, a partir de teorias da geografia humanista, também compõem meus objetos de estudo que se acercam do cinema, da pornografia e da literatura em uma fronteira permeada pela autorreferencialidade e pela ficção.

Como se deu a proposta para o Festival Arte Atual? Conte um pouco do processo de elaboração e montagem.

Em RITO BRUTO o lugar do desenho é discutido como tempo. Há o que acredito ser um dos pontos centrais deste trabalho e que, se apresenta como questão para além da forma, uma provocação que defino como pausa àquilo que talvez tenhamos olvidado de perceber por meio de suas configurações infinitas de ser, para além do ato em si. Com base nesse processo, busco afirmar o desenho como ação do estar presente (em uma série de desenhos sobre papel, pinturas, vídeo e escultura) que, de alguma forma, implicam em pausas daquilo que nos é arrancado à medida que avançamos a um estado isolado, transitório e desfocado. Articular este projeto a partir dessa reflexão foi um exercício; a instalação foi pensada especificamente para ocupar a galeria do Instituto e possibilitar que parte deste trabalho fosse construído pelo público, o que envolveu tempo, mas não apenas de trabalho do público em relação à obra. No momento em que assumem sua autoria, também partilham da urgência de uma ação que se sobrepõe a outras ações e que envolve, no fundo, retomar o desenhar enquanto um contínuo estado de transformação, acúmulo e pausa. É sobre estar presente e lutar contra a própria ânsia de não fixar que este tempo se localiza.

Pensando no tema da exposição, nas noções de absurdo, acúmulo e serialidade, como você vê essa discussão refletida no seu trabalho?

Estas questões permeiam meu fluxo de trabalho, que é intenso. Por isso o absurdo é estimulado proporcionalmente à medida que produzo (e isso inclui não produzir plasticamente), visto que nem sempre estar em atelier significa estar gerando algo material. O processo de pensamento por si só é absurdo e gera acúmulo. Por hora, nosso banco visual alimentado por textos e imagens ganha uma escala incoerente e descabida pela maneira com a qual nos relacionamos com este input imagético. Às vezes, isto se configura plasticamente em meu trabalho. Em outras, creio que nem tudo se limita à redução de sua essência à plástica, visto que este absurdo, suas aproximações e repulsas, podem ser preservadas na retina ou até mesmo nos textos e nas imagens as quais eles nos remetem. Por vezes essas ideias parecem dar conta daquilo que na prática seriam enclausuradas e engolidas pelos limites da matéria e se perderiam em suas possibilidades de significado.