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Postado em 22/03/2012 - 2:04
Desconfigurando o cubo branco
Juliana Monachesi, em NY

Transfiguração do ambiente convencional de exposições de arte marca a produção contemporânea

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Legenda:Instalação de John Miller na galeria Metro Pictures, em Chelsea

Pedras e plantas artificiais, plotagens fotográficas fazendo as vezes de papel de parede, elementos decorativos comprados em loja ou feitos à mão compõem um ambiente situado em um limbo entre espaço público e privado. Os arquivos de metal, típicos de ambientes burocráticos, são dispostos ora no chão, ora sobre pedestais de escultura e pintados com tintas cintilantes – a que John Miller dá o nome de “acabamento envenenado”. Sua exposição individual mais recente, intitulada Suburban Past Time, ficou em cartaz até dia 10 de março na galeria Metro Pictures, em Nova York.

“As obras incluídas na mostra são uma continuação da permanente investigação sociológica do artista acerca da cultura pseudo-intelectual, que tem como foco principal o artifício nas sociedades de consumo do Ocidente”, explica o texto de divulgação fornecido pela galeria. “Para evocar um senso do genérico, Miller cola duas impressões vetorizadas, para servir de papel de parede, que retratam vistas exteriores de edifícios pré-fabricados genéricos em Berlim e uma praia de veraneio de classes trabalhadoras na ilha turística de Mallorca, na Espanha”, prossegue o texto. 

A pedra e a árvore fakes são uma referência à prática de utilizar imitações de plástico para esconder a bomba da piscina em quintais do subúrbio. E as animações em flash que encerram a mostra derivam de uma colaboração musical entre Miller e Takuji Kogo. Sob o pseudônimo Robot, a dupla compõe letras de música a partir de textos de anúncios pessoais para evidenciar e desconstruir as hierarquias culturais. Aqui, as letras das músicas são projetadas junto de um stop motion que retrata o interior de uma casa de jogos suburbana.

Neste misto de espaço público e privado ou de ambientação para obras de arte e de instalação propriamente dita, a exposição de John Miller se destaca no contexto altamente profissionalizado e institucionalizado de Chelsea, onde várias galerias optam por praticar uma neutralidade do espaço expositivo que concorre com os mais clássicos cubos brancos de museu. Mas John Miller não está sozinho. Outras mostras no bairro das galerias e na região do Downtown apontam a desestabilização do “cubo branco” como tendência irreversível na paisagem institucional e comercial das artes. 

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Legenda:Escultura de Haegue Yang em exposição na galeria Greene Naftali

Intitulada Multi Faith Room, a individual da artista coreana Haegue Yang na Greene Naftali – berço dos artistas experimentais mais instigantes que despontam em Nova York – faz referência às capelas ecumênicas dos aeroportos internacionais. A “sala multi-fé” inspirou a artista a criar objetos mundanos e produtos sugestivos de um “turismo xamanístico”: dada a dissolução das diferenças entre os territórios místico, econômico e social, informa o press release, Haegue Yang explora os espaços fraturados e liminares que resultam deste estilo de vida de transitoriedade permanente.

Continua o texto fornecido pela galeria: “As obras nesta exposição estão situadas dentro do contexto de uma impressão digital de grandes dimensões para decoração [papel de parede], feita em colaboração com o designer gráfico baseado em Berlim [onde a artista vive] Manuel Raeder. Retratando uma paisagem urbana asiática invertida, Multiple Mourning Room reúne imagens que vão do próprio trabalho da artista a árvores de bonsai e cruzes de túmulos Shinto imersos em um espaço virtual impossível. Tempo e fisicalidade são colapsados em um panorama sobrenatural, que posiciona o espectador em um campo fenomenológico desorientador e que catalisa relações associativas”.

Completam a exposição colagens e esculturas feitas de persianas – obras que são marca registrada da artista, como pudemos ver na obra que ela mostrou na 27a Bienal de São Paulo – intituladas, aqui, Towers on String. Diferente da obra exibida em SP, onde as persianas delimitavam um ambiente em que se podia entrar, na galeria Greene Naftali, o material se configura como esculturas autônomas suspensas a partir do teto. “As esculturas ocupam volumes espaciais independentes e assumem uma presença monolítica e transparente na medida em que elas relevam e obstruem simultaneamente a luz e o ambiente visual”, filosofa o sofisticado texto de divulgação. 

As colagens da série Trustworthy, feitas com o verso de envelopes de segurança que apresentam uma padronagem geométrica, “também levantam questões acerca do é visível e o é escondido no entorno cotidiano ao mesmo tempo em que exploram efeitos óticos de geometria, simetria e gradação. Constelações das obras meticulosamente feitas à mão são instaladas em arranjos variáveis que se relacionam com o espaço arquitetônico, ativando as composições com um senso dinâmico de movimento”, conclui o texto do release. A Greene Naftali pode ter institucionalizado e elitizado o press release, mas na configuração de seu espaço físico, costuma democratizar e secularizar a arte contemporânea.

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Legenda:Detalhe da exposição de Jon Kessler na galeria Salon 94 Bowery, em Downtown NY

Confira na galeria acima diversos registros das exposições mencionadas e também da individual de Carlito Carvalhosa na galeria Sonnabend, da exposição do fotógrafo Paul Graham na Pace Gallery – em que uma “simples” desnivelada no posicionamento tradicional de obras fotográficas transfigura completamente o espaço da exposição – e da psicodélica exposição individual de Jon Kessler na galeria Salon 94 Bowery.

(Fotos: Juliana Monachesi / estúdio seLecT) 

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