icon-plus
Capa do segundo volume de Dom Quixote adaptado para os quadrinhos por Caco Galhardo (Foto: Divulgação)
Postado em 29/11/2013 - 5:37
Dom Quixote for dummies
Uma bem sucedida adaptação do segundo volume da obra prima de Cervantes
Guilherme Kujawski

Conta-se que, nos círculos literários genuínos, intelectuais dignos desse atributo, perguntam-se curiosos: “já leu o Dom Quixote esse ano?”. Um dos maiores clássicos da literatura mundial, a obra de Miguel de Cervantes é merecedora de não uma ou duas leituras, mas de várias, tal a riqueza de detalhes onomásticos, imbricações narrativas e, claro, um tipo de escrita que eleva uma língua românica ao cume da glória.

Assim, a publicação do segundo volume do clássico adaptado para o universo das histórias em quadrinhos é mais do que bem-vinda. Lançado pela Editora Peirópolis como parte da coleção “Clássicos em HQ”, o álbum, roteirizado e ilustrado pelo cartunista Caco Galhardo, faz jus não apenas ao primeiro volume (publicado há exatos dez anos atrás), como também aos livros originais, tidos como precursores do romance moderno.

Claro que a tarefa de adaptar um romance desse calibre requer fazer escolhas, dada a dificuldade de condensação. Mas o gênio benfazejo de Galhardo conseguiu a dupla proeza de manter não apenas a linguagem rebuscada – repleta de elipses, pronomes pessoais na segunda pessoa e figuras de retórica como a ekphrasis (descrição que procura tornar o mais real possível o que está sendo descrito) – como também os traços das famosas gravuras de Gustave Doré, a sua principal fonte de inspiração visual.

Verdadeira porta de entrada para o romance original, a adaptação de Galhardo realiza um recorte eficiente dos melhores episódios, como a cena em que o cavaleiro da triste figura “domestica” um leão (e daí passa a se chamar Cavaleiro dos Leões), a incursão pela gruta de Montesinos, o encontro com o mago Merlim, a peleja contra o Cavaleiro da Branca Lua e o glorioso desfecho com a ceifadora. E, claro, como não citar o hilariante Sancho Pança e seus mordazes comentários? Tudo está lá no trabalho de Galhardo, na medida exata, em uma química perfeita.

Ao cabo e ao final, o leitor que ainda não mergulhou na obra de Cervantes vai certamente se deixar seduzir pelo barroquismo e pela engenhosa sátira política que tem diante de si. Fora a discussão filosófica sobre o idealismo, sobre como a objetividade é eventualmente cancelada por figuras mentais de todas as ordens, sobre como vivemos em função de nossas ilusões e crenças. É uma obra prima definitiva e a adaptação de Galhardo apenas reforça essa constatação.

Tags  
caco galhardo   dom quixote   hq   quadrinhos