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Postado em 22/05/2012 - 9:28
Feminismo a beira do mar
Nina Gazire

Grupo de curadores suíços e brasilerios ocupam o Solar Unhão com exposição dedicada as questões de gênero

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A associação cultural Charlatan
tem sua matriz na cidade de Friburgo, na Suíça, mas suas sedes são desterritorializadas. O grupo, fundado por Jean-Damien Fleury, composto de artistas curadores e teóricos da arte, já realizou projetos em diferentes partes do mundo, sempre em parceria com artistas locais das cidades nas quais estão atuando. E por suas configurações sempre se darem de maneira temporária e em variadas situações culturais, uma dos principais objetivos do Charlatan é o de usar a arte para tratar as diferenças de poder que emergem na sociedade globalizada.

Em seu primeiro projeto brasileiro, o tema escolhido foi desigualdades de gênero na contemporaneidade. Tendo como cenário a cidade de Salvador_ a mostra que está em cartaz no Museu de Arte Moderna da Bahia_ reúne cinco diferentes curadorias comandadas pelos suíços Jean-Damien Fleury, Esther Maria Jungo, Sarah Glaisen e pelo brasileiro Adailton Santos. Denominada Remue-ménage
, expressão francesa que em português se aproxima da palavra “comoção”, aqui, segundo a curadora Sarah Glaisen, significa a possibilidade de arranjos mutáveis e coletivos que definem a prática artística na atualidade. “A mostra é feita de combinações, encontros entre artistas que articulam suas práticas de acordo com a temática proposta e seu contexto cultural”, explica a curadora que selecionou uma programação com mais de 40 vídeos de realizadoras voltadas a questão feminina, entre elas as artistas Pipilotti Rist e Anna Winteler.

Ocupando diferentes espaços do antigo Solar Unhão, localizado à beira mar, 19 artistas suíços e brasilerios, mulheres e homens, se apropriam do antigo moinho de engenho transformando-o em um espaço para arte de cunho feminista. Além da curadoria de videoarte feita por Gleisen, outros quatro eixos apresentam obras em diferentes suportes como instalação, pintura, objetos e fotografia. Sobre a escolha do tema, Glaisen afirma que é primeira vez que o Charlatan trabalha com a temática feminista. Em um projeto anterior, realizado na República Democrática do Congo, o grupo trabalhou com questões como o colonialismo e suas conseqüências permanentes no país africano. “As desigualdades de sexos e o multiculturalismo são questões que estão no centro das ações do Charlatan. O que nos interessa é investigar as desigualdades de discursos e poderes”, continua Gleisen.

O discurso feminista, por exemplo, é o centro da curadoria Podemos Fazê-lo! – We can do it! , de Jean-Damien Fleury. Recolhendo frases e slogans ligados à figura feminina, o curador produziu uma série de flyers, que segundo o texto assinado por ele, “são uma campanha de propaganda destinada a engrandecer a imagem da mulher e desestabilizar o machismo”. Completando a ação, Fleury recolheu depoimentos de mulheres soteropolitanas que comentavam as afirmações presentes nas peças gráficas, cujo resultado é um vídeo exposto próximo a um display onde os flyers podem ser retirados pelo público.

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Fora de Mim é o nome da curadoria comandada por Esther Maria Jungo. A proposta foi a de criar um ateliê “in loco” onde as condições de gênero são questionadas para além dos limites do corpo a partir “dos mecanismos cerebrais que nos permitem extrapolar a nossa consciência, de sair de nós mesmos, a partir de uma abordagem histórica”, declara ela. Destaque da curadoria, é a presença das artistas Muda Mathis, SUS Zwick e Franzi Madorin, membros do coletivo multimídia Les Reines Prochaines. O grupo, que também é uma banda de punk-rock do qual a videoartista Pipilotti Rist já fez parte, atua a mais de quarenta anos tratando a temática feminista de maneira bem humorada, porém não menos séria. “As feminista se levam muito a sério e isso fez com que o termo ganhasse uma conotação ruim durante os anos de 1980 e 1990”, explica a artista Muda Mathis. Para a exposição, as artistas prepararam uma série de fotos onde encenam com ironia situações que ilustram valores considerados por elas importantes para a luta feminista.

No dia 24 de maio, acontece a última parte do projeto, o Ateliê Acadêmico Gênero e Diferença. Com curadoria do artista baiano Adailton Santos, o encontro reunirá artistas e pesquisadores que discutirão a questão do gênero dentro do âmbito das artes. Ainda na Galeria 1 do museu, foi  criado um  lounge pelas artistas Nicole Rechsteiner e Mireille Henry que será um tipo de um gabinete de curiosidades, um espaço artístico e de documentação no qual os visitantes podem não apenas tirar dúvidas sobre a mostra, mas também sobre outros temas da atualidade. Vídeos, fotografias, objetos, livros e computadores com acesso à internet vão auxiliar a pesquisa dos visitantes sobre temas propostos. A exposição Reume-mánage, que ficará em cartaz até o dia 22 de julho, seguirá para a cidade de Friburgo levando a participação brasileira de Maurício Dias e Walter Riedweg, que no momento possuem uma retrospectiva no MAM-Bahia, mesmo local da mostra organizada pelo Charlatan.