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Postado em 01/09/2011 - 4:38
Jornalismo sem lucro

Em dois anos, a circulação de jornais caiu 30% nos EUA e 15% no Japão. O que será do jornalismo investigativo, caro e de lenta maturação?

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Treze meses de investigações renderam o aplicativo Myfault, que detecta se um edifício está em área de terremoto (fotomontagem Estúdio seLecT)

Mario Cesar Carvalho

É o apocalipse do papel. Entre 2007 e 2009, a circulação de jornais caiu 30% nos Estados Unidos, 22% no Reino Unido e 15% no Japão, segundo estudo da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), entidade que reúne os países mais ricos do mundo. Se o jornal de papel corre risco, imagine então o que será do jornalismo investigativo, aquele que incomoda, inclusive, os donos de jornais, pois é caro e de lenta maturação.

Nos EUA, onde a morte de jornais e a eclosão de similares tecnológicos andam de mãos dadas, surgiram as primeiras respostas para essa dúvida. É uma espécie de jornalismo ONG, sem fins lucrativos, no qual os altos custos da investigação são bancados por fundações ou milionários. As experiências mais famosas são as do ProPublica e do California Watch. No Brasil, uma entidade similar, a Publica, começa a divulgar suas primeiras investigações. Todas têm em comum a crença de que os jornais já não dão conta de todas as investigações que uma democracia necessita para funcionar. Todas trabalham com temas de alto interesse público.

A experiência mais bem-sucedida é a do ProPublica. A organização nasceu no fim de 2007. Paul Steiger, editor do ProPublica, era o chefão do Wall Street Journal, o mais bem-sucedido jornal norte-americano. Steiger diz estar em busca de reportagens com “força moral”. Com esse mote que parece saído de um filme de Frank Capra, o ProPublica já ganhou dois prêmios Pulitzer, o mais importante dos EUA. Uma das investigações premiadas (sobre o tratamento que os hospitais de New Orleans deram às vítimas do Katrina) demorou dois anos para ficar pronta. O ProPublica só para de pé porque recebeu um financiamento anual de US$ 10 milhões de um casal de milionários da Califórnia, Herbert e Marion Sandler.

O California Watch, criado dentro da Universidade de Berkeley, é bem mais modesto em recursos, mas não em ambições jornalísticas. Uma investigação de 13 meses do grupo revelou que a Califórnia tem centenas de escolas e hospitais públicos em zonas de terremoto, onde é proibido construir, em tese. A descoberta foi transformada em reportagens para rádios, tevê, internet e até um aplicativo para iPhone, por meio do qual é possível descobrir se um hospital de San Diego ou de Los Angeles está em área de terremoto. Só o aplicativo é pago (US$ 0,99). Jornais, tevês e rádios recebiam o conteúdo do California Watch de graça. Para os que acreditam que o jornalismo investigativo está morrendo (estou fora desse time), essas experiências mostram que será um enterro de gala.