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Postado em 11/02/2015 - 5:33
Panorama ancestral
Luciana Pareja Norbiato

Conheça o conceito e os (apenas) seis artistas selecionados por Aracy Amaral e Paulo Miyada para a próxima edição da mostra bienal do Museu de Arte Moderna de São Paulo

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Legenda: Zoólito em forma de ave que remonta à pré-História brasileira e é a base da pesquisa de Aracy Amaral para o próximo Panorama da Arte Brasileira, do MAM

Quando convidada pelo curador do MAM, Felipe Chaimovich, para cuidar do 34º Panorama da Arte Brasileira, a historiadora da arte Aracy Amaral titubeou. “Ele me perguntou se eu tinha alguma pesquisa para apresentar. Eu disse: tenho, mas não sei se vocês vão querer”. O fato é que sim, a pesquisa foi aprovada e remonta a tempos ancestrais para colocar em pauta as noções de território, identidade nacional e tradição artística do Brasil. 

Partindo da premissa da mostra bienal do MAM de trazer uma visão atual sobre a arte do país, Aracy Amaral foi buscar em seu interesse pelos zoólitos, esculturas em basalto de refinamento formal tendo entre 2 mil a 7 mil anos típicas do litoral do Sul do continente, um ponto de tensão com a tradição artística daqui. Para ajudá-la na tarefa, além do curador adjunto Paulo Miyada, a historiadora contará com consultoria especial do pesquisador e arqueólogo André Prous, catedrático da UFMG e responsável pela tese sobre a pré-História do litoral brasileiro que lançou atenção sobre esses artefatos nos anos 1970.

Essas formas de animais foram encontradas em grandes aglomerados de conchas que os pesquisadores atribuem a populações pré-históricas brasileiras, os chamados sambaquis, que se calcificaram e perduraram graças à ação das intempéries. Muitos deles sofrem hoje danos causados pelo contato com o mar, que não os atingia quando foram feitos, mas os alcançou com a subida do nível de 20 a 30 metros.

Mesmo realizados durante um intervalo tão grande de tempo, os zoólitos conservam uma espantosa unidade formal. Apesar de terem perdurado, tanto os sambaquis quanto as esculturas não respondem a perguntas sobre como viviam tais povos, por não terem um caráter utilitário claro. “Antes de serem concludentes, eles abrem mais questões, deixam mais perguntas no ar”, afirma Amaral. 

Para dar aos zoólitos lugar de destaque na expografia da mostra, a cargo do arquiteto Alvaro Razuk, Aracy Amaral e Paulo Miyada quiseram reduzir ao mínimo o número de artistas de poéticas variadas, configurando um grupo heterogêneo. Eles se relacionarão com os objetos pré-históricos apresentando conjuntos de trabalhos que serão quase todos feitos especialmente para a exposição. “Não serão trabalhos que farão uma remissão formal aos artefatos. Serão leituras que vão problematizar questões como memória, identidade e tradição artística brasileiras”. 

A lista é formada por Berna Reale, Cao Guimarães, Cildo Meireles, Erika Verzutti, Miguel Rio Branco e Pitágoras. Com o número exíguo de selecionados, a intenção é trazer “quase individuais de cada um”, segundo Miyada. Dessa forma, os próprios artistas serão núcleos da mostra, que não terá subtemas dividindo o espaço expositivo. Na atual indefinição dos projetos – ou no laconismo dos curadores, que não deram pistas sobre o que cada um irá apresentar – resta aguardar o resultado final, cuja abertura está marcada para 3 de outubro sob o título Da Pedra, Da Terra, Daqui.