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Postado em 25/08/2011 - 10:55
Provocações nas margens do real

Cinco artistas que trabalham no limite entre a representação e invenção, entre o natural e o artificial.


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Goiania Golf Club, propõe um dilema: a paisagem é analógica ou digital? Foto: Caio Reisewitz

Nina Gazire

Ao olharmos a foto Goiânia Golf Club, do artista paulistano Caio Reisewitz, não sabemos se estamos diante de uma paisagem real ou uma daquelas feitas em computador. Existe algo de asséptico na paisagem de incrível nitidez: o verde é muito uniforme e o gramado parece tão milimetricamente aparado que duvidamos existir algo assim no mundo real. A surpresa está no fato de que a foto foi feita de modo analógico e a paisagem é mesmo real, de um clube verdadeiro de golfe, existente na capital goiana.

Reisewitz admite que tem forte influência dos mestres pintores paisagistas, como o holandês Frans Post ou o francês Nicolas Taunay. Ele pensa os enquadramentos, os ângulos, amadurece a composição da paisagem em sua mente antes de se posicionar diante da câmera. Fotografa tudo com uma Linhoff, especial para fotos em grandes formatos. “Ela possibilita extrema nitidez para ampliações enormes. Uma câmera digital não consegue essa qualidade”, explica Reisewitz. A imagem do campo de golfe, feita em 2007, integrou a grande exposição monográfica do artista, denominada Parece Verdade, realizada de janeiro a março de 2010, no Centro Cultural Banco do Brasil do Rio de Janeiro.

Apesar de Reisewitz focar sua obra na produção analógica, na memória pictórica e no vocabulário visual da paisagem (um dos gêneros de maior prestígio da pintura romântica), seu objetivo explícito é gerar estranhamentos entre o que é real e o que é construído. O artista trata de embaralhar representação e fabulação em fotos como Joaçaba e Suiará. À primeira vista, Joaçaba, de 2010, parece documentar um rio em uma mata fechada. Suiará, de 2005, estaria retratando uma floresta e, ao fundo, um horizonte com mar. Essas duas leituras são feitas por alguém desavisado. Olhos
mais atentos percebem que, no meio da corredeira de Joaçaba, há a presença surreal e em escala reduzida de uma cidade com seus arranha-céus. Em Suiará, há uma insólita e pequenina favela no meio da floresta. Ambas as imagens são fotografias do real que, reunidas na mesma composição, são também um artifício: colagens manuais feitas pelo fotógrafo para destacar sua temática recorrente de defesa do meio ambiente.

A colagem é uma técnica que remonta aos dadaístas do início do século passado, mas as realizadas por Reisewitz acrescentam a essa matriz histórica o toque autoral da camuflagem e da simulação. Ele propõe uma cena ilusória em que o riacho Joaçaba, subitamente agigantado pela escala mínima da cidade, pudesse engolfar e destruir os edifícios de concreto. O território e da simulação hiper-real pertence hoje, massivamente, ao digital. Mas pode ser analógico e manual, sem perder a característica de artificialidade construída. Se não fosse o artista ter usado tesoura e cola, as imagens bem poderiam ter sido feitas por qualquer programa digital de edição. Reisewitz nota que o próprio título da exposição de 2010, Parece Verdade, destaca o fulcro do seu trabalho. “Faço imagens que são captadas da realidade e parecem artificiais; ao mesmo tempo, crio imagens artificiais que parecem reais. É mais ou menos nesse campo que eu ando”, afirma.

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