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Postado em 04/10/2011 - 6:27
Quando a vida se torna arte
JM

Esquetes de um roteiro de Monty Python? Detalhes burocráticos de programas sociais comunitários? Nada disso, é arte socialmente engajada!

Surasi-kusolwong

No dia 23 de setembro, o Creative Time, organização sem fins lucrativos sediada em Nova York que desenvolve projetos de arte pública mundo afora desde 1974, realizou o Creative Time Summit: Living as Form, uma conferência em que se discutiu o engajamento dos artistas e criadores nas questões prementes do mundo atual. No mesmo dia, a organização inaugurou uma ocupação artística no antigo mercado da rua Essex, além de oito novos projetos comissionados na mesma região de Nova York, no Lower East Side.

Uma semana depois, o NYT publicou a resenha de Ken Johson a respeito das intervenções: após afirmar que as temporárias paredes baixas erguidas com blocos de concreto e as estantes de metal cinza que dividem o espaço da antiga sede do mercado público criam um ambiente que sugere um quartel-general de milícias revolucionárias, o crítico sublinha a carga simbólica dos trabalhos, levantando dois problemas: segundo ele, ou as obras contêm pouca ambiguidade ou são simplesmente indissociáveis de projetos sociais ou comunitários.

“A maioria dos projetos mira sem ambivalência resultados pragmáticos no mundo real. Para seu Operation Paydirt/Fundred Dollar Bill Project, Mel Chin convidou pessoas aqui e nos Estados Unidos inteiro para preencher impressões caricatas de notas de 100 dólares. Um carro blindado vai entregar quase 400 mil destas notas para o Congresso em uma iniciativa que pretende estimular legislação e financiamento para limpar terrenos contaminados por chumbo em Nova Orleans. (…) O que se ganha ao ver certos programas como arte em vez de vê-los como trabalho social?”, pergunta Johson.

Mais adiante, chega ao ponto central do argumento: “É típico de boa parte das ações de base social, entretanto, que toda a experiência só possa ser vivenciada por aqueles diretamente envolvidos do começo ao fim. O resto de nós precisa imaginar um projeto como o do sr. Chin por meio da leitura de descrições da obra e do estudo de documentação fotográfica ou em vídeo, impressos e publicações. Como é que podemos formar opiniões sobre este tipo de trabalho se ficamos sabendo dele de maneira tão indireta? O problema se acentua por descrições que em geral soam como algo escrito por e para burocratas, o que frequentemente é o caso, dada a dependência de financiamento institucional comum a este gênero de projetos”.

Pedro Reyes

Ok, os problemas estão levantados, mister critic, mas não haveria algo a dizer sobre a potência estritamente artística de uns tantos trabalhos reunidos no evento? O trabalho de Pedro Reyes, Palas por Pistolas, em que “1.527 armas foram recolhidas em uma cidade mexicana assolada pela violência relacionada às drogas”, segundo informa o próprio Johson, que prossegue: “As armas foram derretidas e transformadas em pás, que foram então usadas ​​para plantar árvores em terrenos de escolas públicas”. Este, bem como Golden Ghost -a instalação de Surasi Kusolwong com fios coloridos (resíduos de fábrica) no fundo da qual o artista escondeu seis jóias de ouro, que podem ficar para o visitante que as encontrar- são trabalhos de grande apelo visual (e simbólico), que, por isso mesmo, estravazam a leitura obras-engajadas-não-se-distinguem-de-projetos-sociais que o crítico propõe.

http://vimeo.com/28065306

Para um relato bem-humorado da conferência do dia 23 de setembro, leia o post do artblog. A ocupação Living as Form fica em cartaz até 16 de outubro no Historic Essex Street Market (80 Essex Street, abaixo da Delancey Street, Lower East Side, Nova York; (212) 206-6674, Ext. 222, creativetime.org). Um post em outro blog, o hyperallergic, foi a fonte das imagens da ocupação reproduzidas na galeria (Fotos Janelle Grace).

Fotos Damon Winter/The New York Times