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Projeção sem título na entrada da exposição do MAM-RJ, em que a própria artista interpreta Fitzcarraldo, personagem de Klaus Kinski, no filme homônimo de Werner Herzog. (Foto: Paula Alzugaray)
Postado em 06/08/2015 - 6:53
Aparições sob outra luz
Dominique Gonzalez-Foerster propõe reflexão sobre a velocidade e a relatividade do tempo, em exposição no Rio, que é também preâmbulo para retrospectiva em setembro, no Centre Pompidou
Paula Alzugaray

Para entrar na exposição de Dominique Gonzalez-Foerster no MAM-RJ é preciso atravessar o espectro de Fitzcarraldo. A imagem holográfica da personagem criada por Werner Herzog para o ator Klaus Kinski – e aqui interpretada pela artista –, é projetada sobre a cortina de fitas que demarca a passagem para a sala de 1,8 mil metros quadrados do museu, onde foi montada a exposição Temporama.

Gonzalez-Foerster, que recebe seLecT, avisa que este prefácio da exposição não está completamente conectado com o que está lá dentro. Do outro lado das cortinas, propõe-se uma viagem no tempo, ao longo de perto de 15 obras realizadas em início de carreira, entre 1985 e 1991, e remontadas pela primeira vez na mostra que tem curadoria de Pablo León de La Barra. “Fitzcarraldo é um símbolo da transformação da Amazônia, que começa antes da mudança climática global”, diz a artista. “Mas ele também expressa uma vontade dominadora sobre a natureza, que no Brasil tem a ver, por exemplo, com o Inhotim e sua ação transformadora sobre a natureza. Para o bem e para o mal”, compara.

Mas, em realidade, o Fitzcarraldo de DGF não está tão isolado assim do resto. Além de ser um elemento atemporal, ao sugerir uma reflexão de caráter ecológico absolutamente atual, o fantas- ma relaciona-se diretamente com a obra central da exposição, a piscina com imagens fotográficas de Gonzalez-Foerster caracterizada como Marilyn Monroe em seu último filme, Something’s Got to Give. Ambas são obras da nova série Aparições, iniciada em 2014. O fato de a piscina ser inspirada no último filme de Marilyn, interrompido pela morte da atriz, em 1962, portanto inacabado, sugere que esta tampouco é uma exposição “fechada”.

Temporama é um percurso aberto de conexões extratemporais e extraespaciais propostas pela artista e a curadoria. Descobre-se que muitas das obras recentes já se delineavam nos primeiros anos, em que a jovem artista lidava basicamente com objetos e cruzamentos insuspeitos entre eles. “O readymade era uma questão nos anos 1980. Sinto que o século 20 está se afastando muito rápido”, diz DGF. “O século 21 será muito mais virtual, baseado nas relações entre tempo e espaço.”

As viagens pelo tempo são um partido investigativo constante na trajetória da artista francesa. Se em sua última grande exposição de 2014, Splendide Hotel, no Palácio de Cristal, em Madri, ela travou um diálogo com o século 19, em Temporama assume um compromisso com o século 20: tanto no ímpeto de revisitar sua jovem produção, realizada no fim do século, quanto em ceder protagonismo ao edifício modernista onde expõe, pintando suas janelas com filtros magenta e azuis e chamando a atenção para a potência do exterior que invade o espaço expositivo. “É bom ver esses trabalhos sob uma luz e uma cor diferentes”, diz León de La Barra. Na exposição 1887-2058, prevista para abrir no Centre Pompidou, em setembro, o impulso de expansão temporal será ainda mais evidente. “O tempo que está contido dentro dos trabalhos é mais importante do que o ano em que eles foram feitos”, diz ela.

Serviço

Dominique Gonzalez-Foerster, Temporama

Até 9 de agosto

MAM-RJ Avenida Infante Dom Henrique, 85, Parque do Flamengo, Rio de Janeiro

*Publicado originalmente na #select25